Cotidiano

Cotidiano

 

Chegou do trabalho cansado. A criança corria pela casa destruindo os inimigos, um a um, através de seu super-herói imaginário. A mulher tomava banho. A água fervia para o café. Tomou um copo d´agua e desabou no sofá, ainda com a roupa em que estava. Ligou a TV. No canal escolhido noticiava-se a invasão do Plenário da Câmara por um punhado de aloprados a fim de pedir um golpe militar. Pensou na pequenez do propósito. Como é mais fácil reprimir do que educar. Bater a dialogar. Exigir do que negociar. Comentários do ato esdrúxulo pipocam nos falantes da TV pela âncora, seguido do gesto negativo com a cabeça em reprovação. De lá, a reportagem vai para o Rio de Janeiro, onde a revolta dos servidores deflagrara uma pancadaria. A falência dos Estados… Os royalties do petróleo, que bancavam o funcionalismo, derreteram. Tragédia anunciada desde Garotinho, 1999… “Não podemos colocar custos fixos atrelados a receitas variáveis”, esbraveja, com razão, o comentarista. Imaginou como seria gostoso administrar uma empresa de forma irresponsável e estúpida tendo o povo como fiador. Se eu não tenho como pagar, vocês pagam. Simples assim. A revolta emudecida de todos. Os políticos que não valem nada. Trump. Clima. Juros. Inflação. Violência. Miséria. Riquezas são diferentes…

Melhor tomar um banho. A água quente o relaxava. Primeiro, o cabelo. Depois, o corpo. Agora, enfim, o merecido pijama. Sentou-se a mesa para comer. A mulher comenta sobre a grosseria de quem lembra de você somente quando precisa de alguma coisa que você possui. No caso específico, uma chácara. Ligou para pedir emprestado, mas não ligou para agradecer, nem tampouco a convidou para a festa. Falta de educação… Ele concorda e acrescenta “vivemos num tempo em que se dá mais importância ao que temos ou ao que aparentamos do que ao que somos ou construímos”, diz, filosoficamente, copiando uma frase que lera na Folha, de uma psiquiatra chamada Katia Mecler, que escreveu o livro “Psicopatas do Cotidiano”. Ela acha um absurdo esse ponto em que chegamos. Mas estamos aqui. E construímos isso. Direito após direito, vantagem após vantagem, facilidade atrás de facilidade. Abraçaram-se.

De volta ao sofá. Futebol. Notícias da Seleção que venceu o Peru. Os caras estão jogando muito. Lembrou-se de Romário. Técnico bom é o que não atrapalha. Análises sobre Tite. O Titês… Não teve paciência… Netflix. O oásis no meio do deserto. Primeiro um filme. “A vida secreta das Abelhas” é o escolhido, mas não por causa do filme em si. Foi só porque Alicia Keys o estrelava. Como pode alguém ser tão bom assim? Canta como ninguém. Toca um absurdo de piano. E ainda compõe músicas que ficaram para a história. E ainda é linda!!! Por que tanto para uma pessoa só? Genética? Evolução? Deus? A estória se passa nos EUA durante a luta pelos direitos civis dos negros. Mais precisamente em 1964, quando Lyndon Johnson os libera para votar. É difícil entender o racismo tal qual o é na América. Enraizado, verdadeiro, violento. Mas como para cada ação existe uma reação de mesma intensidade, criou-se Luther King, Malcolm X, Muhammad Ali. Gostou do filme. Mas nada de sono ainda… Último episódio da Primeira Temporada de “Stranger Things”. Esse é infalível!!

Por: Paulo Franco – diretor da Franco Consultoria de Imóveis

 

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1 Comentário

  1. Dayse

    Paulo quanta sensibilidade e clareza tem seus textos. Uma delicia ler. Consigo imagina-lo falando de cada um e ne emociono. Voce consegue ir fundo com estilo. Obrigada fez com que eu conseguisse sortir hoje apesar do Temer e tudo que este momenti turbulento de nossa fragil democracia.
    Dayse

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